O Salvador tem a cor escura da Guiné Bissau e as mãos calejadas pelas gruas que conduz nas obras que lhe dão trabalho. Quando chegou, foram muitos os que o olharam de lado e poucos os que lhe beijaram a face. Nunca deixei que o Salvador almoçasse sozinho ou não tivesse companhia para um café e as nossas conversas sempre intrigaram muita gente. Supostamente pessoas de mundos tão diferentes não deviam ter nada em comum, supostamente não se abraçam nem tão pouco convivem. A verdade é que o Salvador tem mais mundo que os parolos que o julgaram e não me canso de o ouvir falar do Deus em que acredita, da terra que cultiva nas horas vagas, do vinho que faz e distribui pelos amigos com uma simplicidade que só se encontra nos puros e um sorriso de quem não precisa de muito para viver. O Salvador agradece-me recorrentemente o ter sido das poucas a acolhê-lo e eu agradeço-lhe o facto de ser um dos melhores amigos que alguém pode ter. Hoje já não estamos juntos tanto tempo porque, entretanto, as pessoas foram descobrindo o Salvador aos poucos.